21 de abr. de 2007

The Evens em Curitiba

Este blog anunciou aqui, há bastante tempo, o show da dupla The Evens que aconteceu no aniversário de Curitiba, dia 29 de março. Porém, após o show, incrivelmente, nada mais se falou sobre eles.


Pois é, falha desse oligofrênico escrevinhador que vos fala, que estava ocupado com outras coisas e acabou esquecendo de postar a resenha que tinha feito.

Bom, dessa forma, mesmo atrasado, agora que lembrei do fato, faço questão de publicar o texto, só para registrar como a apresentação deles foi realmente antológica para um fã como eu.

Mas antes de mandar vir a resenha, u
ma introdução sobre o The Evens.

Esta banda americana vem de Washington, e é formada por Ian MacKey, voz e guitarra barítona, e Amy Farina, voz e bateria.

Os dois começaram a tocar por volta de 2001, depois que o Fugazi, este excepcional grupo liderado por Ian, interrompeu suas atividades. Vale lembrar também que, antes de formar dupla com Ian, Amy tocava numa ótima banda chamada The Warmers.

Pois bem, em 2005 o The Evens lançou seu primeiro álbum, homônimo, o qual é muito, muito bom. São 12 canções bastante simples e complexas ao mesmo tempo, cheias de nuances, de mudanças de andamento, breaks, enfim, um trabalho que realmente pode ser chamado de arte, e que em 2006 continuou com Get Evens, o segundo disco da banda, este com 10 canções.




No início deste ano então os Evens fizeram a sua primeira turnê mundial. Passaram pela Austrália, Nova Zelândia e depois vieram para a América do Sul. No Brasil, tocaram em várias cidades, sempre em lugares pequenos e alternativos. O show em Curitiba aconteceu no Espaço Cultural 92 Graus.

Pronto. Segue aí a vetusta.


Música é coisa séria

Exigentes com o público, Ian MacKey e Amy Farina também não brincaram em serviço. Deram o sangue em cada canção e realizaram um show que, além de belo, foi bastante politizado


“Just don’t be cool and don’t be shy.” (Ian MacKaye)

“When things should work but don’t work, that’s the work of all these governors” (Trecho de “All these Governors”)

“Everybody knows you’re a liar. (...) You’re fired!!! (Trecho de “Everybody Knows”, que segundo Ian, é dedicada a George Bush)



O show é para começar às oito da noite, mas atrasa. Enquanto isso, ninguém entra no porão do 92 Graus, pois Ian e Amy no momento estão passando o som. O público reduzido – umas cinqüenta pessoas? – se acumula diante da porta. Dali a pouco, surge uma jornalista, não se sabe de onde, interrogando os presentes diante de uma câmera: “O que Ian MacKey representa pra você?”, pergunta ela.

Esses jornalistas, penso comigo, eles e as suas perguntas grandiloqüentes. O que ela quer que o pessoal responda? “Ian mudou a minha vida!”; “É o maior astro de rock de todos os tempos!”

Se bem que, realmente, o sujeito é sim, sem exageros, uma das figuras mais importantes do punk rock mundial, e mudou pelo menos a vida de quem hoje é straightedge. Mas enfim, interessante é o que diz um guri, que tem a resposta para a jornalista, um tanto silogística, na ponta da língua: “Ian criou o Minor Threat, depois o Embrace, mais tarde o Fugazi e por fim o The Evens; logo, The Evens é a evolução do hardcore...”

Lá por nove horas, finalmente, abrem-se as porteiras e a galera (punhado de indies, straightedges, artistas locais e admiradores de boa música em geral) entra. Trato então de pegar uma caipirinha e fico próximo do balcão, sacando algumas beldades que iluminam o local.

Bem, como para variar estou solo e não conheço ninguém, depois de um tempo decido me achegar ao palco, conferir os instrumentos dos Evens: uma guitarra vermelha deveras curtida pelo uso e uma batera bastante simples. Eis tudo. Realmente, não se precisa de muito para se fazer arte, constato. (Ah, e pelo que fiquei sabendo, nem amplificador eles trouxeram. Emprestaram o do vocalista da Relespública).

Eu ali de bobeira, quando Amy e Ian pulam para o palco. Só espero que o “sargento” não venha objetar quanto a minha caipira, penso eu, pois com o sujeito que estava fumando ali perto, Ian já ralhou: “Vai fumar pra lá”, disse. O cara fez que não deu bola, mas depois vazou.

A essa altura o pessoal já está todo espremido diante dos Evens. Ian então nos cumprimenta e emenda a sua preleção habitual. Primeiro nos pergunta ironicamente por que não fomos ao show do Pennywise (na verdade o Pennywise tocaria algumas horas mais tarde no Curitiba Master Hall). Depois avisa que, quem quiser conversar, que vá tagarelar lá fora, afinal as conversas atrapalham a banda.

”Viemos aqui não para fazer um show para vocês, mas com vocês, entenderam? Nós fazemos esse show juntos. (...) Se vocês não interagem, não faz sentido estarmos aqui. Seria o mesmo que eu e a Amy estivéssemos ensaiando. Portanto cante, dance, faça o que quiser. Só não seja ‘cool’ e nem tímido. Somos nós que estamos aqui na frente de vocês, fazendo papel de palhaço, portanto vocês podem fazer o que quiser. Apenas sejam vocês mesmos e não sigam nenhuma convenção, entenderam? Então vamos lá”, e depois desse breve discurso, começa a destrinchar a sua guita com “Shelter Two”, a primeira música do primeiro álbum deles.

É de arrepiar. Apesar de ser uma canção relativamente calma, Ian e Amy realmente botam pra quebrar, põem a alma nisso, e assim o fariam até o final do show. Mesmo sentado num banquinho, fica claro que a postura de Ian se mantém punk. Bate o pé no chão, sacode a cabeça, enfim, canta com emoção, com os culhões! E com Amy é a mesma coisa, aquela mulher miúda, com cara de brava, tocando sua bateria com a classe de um Charlie Watts, e soltando o maior vozeirão.

Algumas músicas depois, Ian dá um tempo para arrumar o seu banco. Sem a menor cerimônia, entrega a guitarra para o primeiro garoto que vê na sua frente, pega um alicate e aumenta o altura do assento. Mais tarde seria Amy quem interromperia uma música para arrumar a sua bateria. “Me passa o alicate, Ian”.

Ian aproveita e diz que isso tudo é falso. Eles só estão “fingindo” todas essas interrrupções, essa falta de profissionalismo. “Que nada, nós vamos ser despedidos...”, brinca ele, que é dono de sua própria gravadora, a Dischord, há mais de vinte anos.

Mais ou menos na metade do show, ao ouvir um grupo de pessoas na maior charla - estavam mesmo atrapalhando -, Ian pára tudo e diz: “Vocês querem que a gente cante mais baixo pra vocês poderem conversar?” “Não, toca mais alto!” grita alguém. E ele, em tom de reprovação, continua: “Música é coisa séria, cara. Tanto que foi ela que nos trouxe até o Brasil. A música estava aqui antes de nós, antes das indústrias fonográficas, antes mesmo da fala, da linguagem. Musica é algo sagrado. Nós não estamos brincando”.

O show prossegue e dali a um tempo o clima melhora. Ian tece loas à cantoria do público. E chega a conclusão. “Sei que os nossos discos são difíceis de se conseguir por aqui. Portanto, se vocês conhecem a nossa música, provavelmente muitos devem ter ouvido pela internet. E quer dizer, não devem ter pagado por ela... (faz então uma pequena pausa dramática). Nós achamos isso ótimo”, emenda ele para a nossa surpresa.

“Música é como água. Há quem queira engarrafá-la e vender para os outros. Mas alguns simplesmente vão bebê-la direto do rio. É para isso que nós fazemos música. Se vocês baixaram nossas musicas na internet, obrigado”.

Por fim, com quase uma hora e vinte de show, quase todas as músicas dos seus dois álbuns executadas, a banda encerra a sua apresentação com “Everybody knows”, canção que, segundo Ian, trata sobre a fugacidade dos políticos: “Uma hora eles vão embora. Está certo que entram outros, mas o que pode ser pior do que isso?”.

“Isso” é claro que significa George W. Bush.

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11 de abr. de 2007

Música e Dança
Começa temporada 2007 da Noite Latina
Ritmos como salsa, samba, bolero, tango e muitos outros, estarão presentes na primeira Noite Latina do ano



Companhia Dança Latina Walmir Secchi em ação: samba de gafieira

Nesta sexta-feira, 13, o Centro de Dança Latina Walmir Secchi (CDLWS) volta a proporcionar uma programação exclusiva aos amantes da música, da dança e do espírito latino.

Começa agora mais uma temporada da Noite Latina em Curitiba, uma série de cinco festas que já estão programadas até dezembro.

A Noite Latina dessa sexta-feira acontece no Capri Eventos, a partir das 22h00, e vai até as 4 da manhã, ao som de ritmos brasileiros, caribenhos e portenhos.

Além de dançar a noite inteira, os presentes também poderão assistir aos shows da Companhia Dança Latina Walmir Secchi, que apresentará coreografias de tango, samba, salsa e merengue.

No restaurante, estará disponível um serviço à la carte. Os ingressos custam R$20 (antecipados) e R$25 (no local).

Sobre a Noite Latina
Criada no final de 1998 por Walmir Secchi, a Noite Latina se transformou num ponto de encontro de todos os admiradores da cultura latina, que ali se reúnem para dançar e ouvir boa música.

Ao longo de suas edições, a Noite Latina já atingiu um público estimado de 27 mil pessoas, sendo considerado o maior evento de dança de salão do Brasil.

Este ano serão realizadas 5 festas: dia 13 abril, 1 de junho, 3 de agosto, 5 de outubro e 7 de dezembro.


Serviço:
Noite Latina, dia 13 de abril, a partir das 22h00, no Capri Eventos. Rodovia Do Café, 3001. Ingressos a R$20 (antecipados) e R$25 (no local). Maiores informações pelo tel.: 3339-4007, ou pelo site http://www.dancalatina.com.br

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4 de abr. de 2007


Uma bomba necessária
Com o monólogo As Nove Partes do Desejo, que estreou no dia 28, no FTC, Clarisse Abujamra nos sensibiliza para a situação dos países em guerra, em especial o Iraque


Clarisse Abujamra em As Nove Partes do Desejo.

Um clima pesado. Muito. Do começo ao fim. E podia ser diferente? As Nove Partes do Desejo, peça escrita pela americana Heather Raffo e que é apresentada pela primeira vez no Brasil, sob a direção de Marcio Aurélio, trata do sofrimento das mulheres iraquianas.

O palco do José Maria Santos é então coberto inteiramente por lona preta. De cima a baixo. Numa escuridão em que nada se distingue, só vemos uma pequena luz num canto, uma vela acesa, e que de repente começa a se mover. A sombra que a carrega, depois se revela como a atriz Clarisse Abujamra, envolta em um negro chador.

No momento ela encarna uma velha à beira de um rio cheio de despojos humanos, mas depois Clarisse se transformaria em muitas outras mulheres, entre elas uma pintora que, mesmo quando poderia ir embora, luta para continuar fazendo arte em seu país, e uma filha de iraquianos que mora nos Estados Unidos.

Teremos assim, nesse monólogo, um panorama sobre o horror que se passa no Iraque destruído pelas guerras e pelo regime ditatorial de Saddam Hussein. Um panorama construído a partir de diversos olhares femininos.


Então vemos mulheres que sofrem por seus maridos (que quando não estão mortos, estão mutilados), por suas crianças (que nascem anômalas ou adoecem gravemente desde cedo, devido às armas químicas), pela terra devastada, e por elas mesmas: desrespeitadas, seviciadas e sem amor.

E assim vamos nos comprimindo em nossas poltronas diante de todos os horrores que são relatados. Finalmente lembramos que do outro lado do mundo existem países que conseguem ser muito piores do que o nosso, e que existem pessoas nesse exato momento padecendo um verdadeiro inferno em vida.

Nesse sentido, nos aproximamos da personagem que mora nos E.U.A e que assiste à guerra pela televisão (nós no momento a assistimos pelo teatro), sofrendo virtualmente. A diferença é que o sofrimento dela não desaparece quando ela desliga a tv, como o nosso desaparecerá quando sairmos daqui. Afinal ela não poderá esquecer que seus familiares iraquianos estão vivendo aquele pesadelo.

Com essa personagem é verdade também que Clarisse deixa o palco um pouquinho mais leve e iluminado, porém isso não impede que eu pegue no sono, mais ou menos na metade do espetáculo.

Se serve como desculpa a este ato nada nobre da minha parte, explico a vocês que eu tinha acordado muito cedo naquela amanhã, e já eram quase onze da noite, aquele teatro escuro...

Até que, eu cochilando, de repente irrompe uma grande explosão, que me faz dar um salto da poltrona na mesma hora. Eram as bombas que caíam sobre o Iraque, matando uma porção de gente, inclusive a personagem pintora. Com isso também sou trazido de volta à peça, que dali a mais alguns minutos se encerra.

Saio do José Maria Santos sonolento, sentindo-me meio mal. Desço a Treze de Maio para pegar o ônibus, e é inevitável que imagens de uma guerra longínqua ainda povoem a minha mente, ao mesmo tempo em que rio do susto que acabei de levar com aquela bomba explodindo.

Já dentro do ônibus é que surge o insight: pensando bem, a peça, com todo o seu peso e a sua contundência, é que foi uma bomba. Das mais necessárias. Só assim para despertar a nossa habitual letargia diante de um assunto tão sério como a guerra.

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1 de abr. de 2007

Os clichês passam longe daqui
Com muita criatividade, o diretor André Paes Leme utiliza os recursos épicos para aproximar o espectador ao texto de Guimarães Rosa
Vladimir Brichta encarna Augusto Matraga.
A Hora e a Vez de Augusto Matraga, que se apresentou no Teatro da Reitoria no dia 27, é daqueles espetáculos raros em que, ao seu término, todos saem de alma lavada, com a certeza de que existem sim, verdadeiras obras primas no teatro.
É impressionante a eficiência dessa montagem. A começar pelo elenco enxuto, apenas 9 pessoas, que se revezam tanto como atores, narradores, sonoplastas e músicos. E todos, sem distinção, trabalham muito bem.
Dá até raiva. Eu me perguntava: como é que pode, todo mundo atuar desse jeito e ainda cantar e tocar sempre afinado? E essa parte musical, coordenada por Alexandre Elias, não é brincadeira. Há músicas do começo ao fim, executadas com uma porção de instrumentos, como violões, acordeom, zabumba, gaita, calimba...
Depois vem a eficiência do cenário e dos elementos cênicos. Todos os objetos, bastante rústicos por sinal, são reduzidos a formas essenciais e também multifuncionais.
Um carro de boi não é só um carro de boi, mas também vira uma cama, uma casa, e muitas outras coisas. As armas usadas pelos cangaceiros, por exemplo, não são armas reais. São ossos, com formatos que lembram armas convencionais. Ou não.
A luta final entre Augusto Matraga e Joãozinho Bem-Bem é feita com crânios de boi, crânios que também ficam pendurados em bambus pelo palco, e que com a luz projetada sobre eles, formam sombras fantásticas.
Isso só para ilustrar como na montagem há uma riqueza de detalhes muito grande, e que deixa qualquer espectador pasmo. E vale lembrar que todos esses recursos, sumariamente descritos aqui, estão inteiramente a serviço do texto de Guimarães Rosa.
Um texto que, todos sabem, não é fácil de se penetrar num primeiro momento. Nada fácil, igualmente, é adaptá-lo para o teatro. Afinal este conto presente em Sagarana é acima de tudo narrativo, e essa estrutura foi mantida pelo diretor André Paes Leme, que se manteve fiel à obra.
A questão é que, a narração, que num teatro brechtiano, por exemplo, geraria distanciamento entre o espectador e o que é apresentado, sob a direção de André, torna-se drama, ação também.
Nesta A Hora e a Vez de Augusto Matraga, o ator quando narra, o faz com uma rica linguagem corporal, e também com entonações das mais variadas. Sem falar que a narração também faz uso de canções, criadas a partir do próprio texto.
O único problema é que, tudo isso, ao mesmo tempo em que é muito atrativo para o público, no começo parece dinâmico demais, muito rápido. Difícil de se apreender.
Confesso que, até a parte em que Augusto Matraga leva a coça dos capangas do Major Consilva, eu não estava entendendo patavinas do que era dito. E a culpa não era dos atores, que apresentaram uma boa dicção. Simplesmente eu ainda não tinha conseguido “entrar” no texto e na história.
Mas justamente nesse momento decisivo, um dos ápices da peça, é que tudo mudou, pelo menos pra mim. Porque numa cena em que muito provavelmente outros diretores fariam com que Matraga apanhasse de forma realista, André colocou os jagunços batendo violentamente numa peça de carne.
Vladimir Brichta, que interpretou Matraga, ficava apenas num canto encolhido, sofrendo virtualmente os golpes. Quer dizer, ao invés de apresentar uma cena brutal, que todo mundo já está acostumado a ver, André Paes a transformou numa cena cômica, inusitada.
Em meio às gargalhada, um homem ao meu lado ainda perguntou: “Isso é carne mesmo?” E apesar de engraçada, a cena não ficou menos contundente, pois você sabe que o personagem está sofrendo.
E o mesmo aconteceu quando Matraga é marcado a ferro, como gado. Um ator então surge com uma frigideira quente, e joga nela um bife. Barulho e cheiro de carne queimando. Brichta grita de dor. O público vai ao delírio.
A partir daí, não tive como não ser fisgado pela peça. Tudo era tão vivo, tão interessante, que meus ouvidos finalmente se “abriram” ao idioma roseano.
A partir de então eu compreendia tudo. De queixo caído.
*
Uma guerra que precisa voltar à cena
Companhia Silenciosa apresenta a leitura dramática de Jesus vem de Hannover no Festival de Teatro de Curitiba

Além de ter encenado a inquietante Mecânica neste Festival de Teatro de Curitiba, a Companhia Silenciosa forneceu uma bela amostra de um espetáculo que está por vir, com a apresentação da leitura dramática de Jesus vem de Hannover, que aconteceu no dia 28 de março, no Teatro Experimental da UFPR (TEUNI).

Nesta leitura, mais do que colocar atores sentadinhos diante de uma mesa (como costumam fazer algumas companhias, sem apelo cênico algum) para declamar a dramaturgia de Léo Glück, o diretor Henrique Saidel optou por ir um pouco mais além.

Primeiro, dispondo os atores entrincheirados nas aberturas subterrâneas do palco do TEUNI. Assim, em seu pequeno bunker, cada ator vestia um óculos divertido, mais uma camiseta com o nome de seu personagem estampado e, finalmente, tinha em mãos o texto de Glück, que seria a munição para a guerra que estava prestes a começar.

Uma trilha sonora marcial, de filmes como A ponte do rio Kwai, também já dava o tom beligerante, que iria contrastar com a pose burlesca dos atores e suas falas.

A leitura logo se mostra uma espécie de jogral nonsense entre os bizarros e sumários personagens de nome Harold, O Furão, Mimi, Merga, A Maníaca, e o protagonista Montgomery Marcelino Jesuíno de Jesus.

Os seis travam então uma série de diálogos curtos, inusitados e desnecessários, isso se alguém ainda esperava por uma história com um sentido fechado e evidente.

Frases do tipo “Dizem que massagem nos seios evita o câncer”; “Você é um Cyborg?”; “O Renascentismo era uma putaria franciscana”, cruzam o palco e voam em direção à platéia como balas perdidas, ou melhor, “frases perdidas”, provocando as mais diversas reações no público.

Há quem ria frouxo com as piadas ácidas da Companhia Silenciosa, há quem ria envergonhado dos chistes politicamente incorretos – como quando dizem que é impossível de se preparar um x-salada chinês em casa, visto a imundície ser irreproduzível –, há quem ria amarelo por não ter compreendido as inúmeras tiradas irônicas, e há quem torça o nariz para toda essa verve inconseqüente.
Ao mesmo tempo, é difícil que alguém não tenha esperado por um maior esclarecimento sobre o intrigante personagem que leva o nome de Jesus. Esclarecimento que obviamente não surge nunca, porém gera uma saborosa tensão ao longo da peça.

Nada a ver com o messias de Belém, o Jesus de Léo Glück vem não só de Hannover como também das terras de Samuel Beckett e de todo o teatro do absurdo.

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